quarta-feira, 7 de abril de 2010

IRMAOS LUMIERE, COSTA-GRAVAS, TRUFFAUT, GODARD, RESNAIS...

IRMAOS LUMIERE, COSTA-GRAVAS, TRUFFAUT, GODARD, RESNAIS...
Abril de 2010.


Quando comento que, podendo ir ao cinema, aproveito para ver dois filmes seguidos, percebo que a pessoa acha estranho, provavelmente me considerando doida de pedra. Por isso, nem ouso acrescentar que aguentaria até mesmo um terceiro, embora nunca tenha me deixado levar por essa verdadeira tara.
Em Paris, aproveitei para ver o simplesmente fantástico documentário Oceans. Como não tinha legenda, perdi alguma coisa, mas consegui entender que foram 7 anos de produção, sendo que 3 apenas adaptando equipamentos para filmar em certas condições e grandes profundidades. Eu já sabia que cerca de 70% da superfície da Terra é constituída de água, e que, disso tudo, 97% estão nos oceanos, mas aquelas maravilhas marinhas realmente me deliciaram os olhos e a alma. Discussões sobre o meio ambiente e o futuro do planeta não são tema dessa crônica e ficam, quem sabe, para um outro dia. Hoje, quero falar de cinema.
Ao voltarmos para casa, comentei com Rosa que ficara impressionada com o cinema lotado, ao final de um dia que era regado por uma chuva bem chatinha que caía sem parar. Isso sem falar no frio que sentimos nas filas enfrentadas, uma para comprar os bilhetes e outra para entrar, filas essas que ficam do lado de fora do prédio! Ela explicou que os franceses são apaixonados por cinema, e que tem filme para todos os gostos e desgostos.
Curiosa, fui ao Pariscope para ver os filmes em cartaz e, impressionada, descobri que, naquela semana, eram simplesmente 79 reprises e, dentre elas, havia filmes dos anos 30, 40... Fora os outros tantos lançamentos e continuações. Isso, em Paris. Em termos da França inteira, com seus 65 milhões de habitantes, são quase 6 mil salas de projeção. Em 2009, foram vendidos duzentos milhões de tickets!!! Um pouco mais de três bilhetes per capita.
Sobre nós, os dados mais recentes que consegui referem-se a 2006. Com pouco menos de 190 milhões habitantes, naquele ano, o público foi de aproximadamente 90 milhões. Mais ou menos 1 bilhete para cada dois brasileiros. O número de salas é de cerca de 2.100 para o país todo.
No continente europeu, os franceses são os que mais produzem filmes, têm o maior público e a maior receita. Na verdade, para os especialistas, a Sétima Arte nasceu na França e todos reconhecem o importante papel desempenhado por eles desde o início da história desse meio de comunicação social. A Nouvelle Vague, nos anos cinquenta, foi, sem dúvida, o mais famoso dos movimentos do cinema daquele país. E a apresentação do filme "L'Arrivée d'un train en gare de la Ciotat"
, dos Irmãos Lumière, é considerada o marco do nascimento do cinema, isso em 1895.
A empresa PATHÉ, por exemplo, começou em 1896, e vi seu logotipo há 15 dias, se não estou enganada, quando assisti Ervas Daninhas, do Resnais que, por sinal, está com 87 anos!. Inesquecível seu Hiroshima, Mon Amour, do livro da Marguerite Duras. O problema foi que, a partir da Primeira Guerra, com a Europa toda sofrendo os reflexos do período, o dinheiro foi escasseando e, então, os Estados Unidos saíram em campo. Como não haviam sofrido na pele, conseguiam produzir seus filmes a um baixo custo. E, espertos, entraram no mercado europeu com toda a força. A história se repete? Hoje são outros produtos? Capitalismo...
Acabei descobrindo que a indústria cinematográfica francesa recebe proteção do governo e, dentre as medidas adotadas, uma é bastante interessante – somente podem ser lançados DVDs de filmes após seis meses de seu lançamento nas telas. Isso ajuda muito, sem dúvida. Aqui no Rio de Janeiro, antes mesmo dos lançamentos, já me oferecem cópias dos filmes!
Eu não sabia que o Festival de Cannes é mais velho do que eu! Dois anos... Sei que ambos estamos ainda em forma, mas somos antigos, não há como negar... A Academia de Artes e Técnicas do Cinema da França, que outorga o Prêmio Cesar, teve sua 35ª. edição esse ano de 2010. Enquanto isso, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos Estados Unidos realizou sua 82ª. cerimônia do Oscar. Por sinal, tanto o melhor filme estrangeiro, o argentino O Segredo de Seus Olhos, quanto o Guerra ao Terror, cuja diretora foi a primeira mulher premiada na categoria, são excelentes. Pena que o filme dela tenha sido prejudicado pela tradução do título aqui no Brasil, pois as palavras assustam grande parte do público, que acredita que verá, apenas, sangue e matança. Não, por trás de tudo, vê-se que a pior guerra que se trava é aqui dentro da gente...
As diferenças que percebo mais evidentes entre o cinema francês e o americano são o ritmo, o desenvolvimento dos personagens e a questão do happy end e finais mais óbvios. É claro que temos finais felizes feitos pelos franceses, e unhappy ends em filmes de Hollywood, mas como média, fica a sensação de que os filmes franceses são menos “comerciais” do que os americanos.
Nunca estudei cinema, nem leio tanto as críticas feitas pelos especialistas, e tudo que digo não passa de opinião pessoal. Existem produções americanas da melhor qualidade que são “marginais” ao esquemão tradicional, como Amistad, do Spielberg, Apocalipse Now, do Oliver Stone... Isso é um alerta para que não sejamos injustos... nem tudo que vem da cinema francês é cult ou “de arte”, e nem tudo vindo dos Estados Unidos é apenas comercial.
Quanto ao Brasil, tive a melhor das surpresas ao descobrir que, em julho de 1896, ou seja, apenas um ano depois do nascimento do cinema, exibiram o primeiro filme aqui no Rio de Janeiro e, logo depois, já havia uma sala de exibição fixa. E mais ou menos 10 anos depois, já tínhamos 20 salas para exibir filmes americanos, franceses, italianos... sempre complementados por curtas brasileiros, cujos temas eram os fatos ocorridos poucos dias antes na cidade.
Já está provado que as páginas policiais, aquelas que quase respingam sangue, atraem meio mundo. Deve ter sido por isso que os primeiros filmes brasileiros foram dessa linha. Tivemos “Os Estranguladores”, de 1906, que foi um sucesso, com mais de 800 exibições somente aqui no Rio; depois, “O Crime da Mala”, do Francisco Serrador, em 1908 e “Noivado de Sangue”, de 1909. Depois, a gente rejeita o Guerra ao Terror...
Já em 1911, porém, os americanos se apresentaram nessas praias, e o Cinema Avenida foi aberto exclusivamente para exibir filmes de uma determinada produtora americana. E Francisco Serrador desistiu de produzir e criou a primeira grande rede de salas de exibição, virando um distribuidor de sucesso. Para completar nossa tragédia cultural, a partir de 1930, os filmes americanos passaram a entrar no Brasil sem pagar as taxas de importação.... Golpe mortal na produção nacional. Em 1942, dos 400 filmes lançados em nosso país, somente um era nosso. A lei do mais forte prevaleceu.
Glauber, Paulo Cesar Saraceni, Leon Hiszman, Nelson Pereira dos Santos, Joaquim Pedro de Andrade, Ruy Guerra, Cacá Diegues e outros mais, nos anos 60, iniciaram uma luta em prol de um cinema nacional mais forte. E o chamado Cinema Novo apresentou filmes de grande qualidade, como “Vidas Secas”, “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, “Terra em Transe”, “Macunaíma”, dentre outros mais.
Fui conferir os prêmios que “O Pagador de Promessas” recebeu, pois foi o único premiado daquele período. Eu só me lembrava da Palma de Ouro, de Cannes, mas recebeu mais alguns outros e chegou a ser indicado ao Oscar de 1963, o que demonstra que o mundo começou a reconhecer a qualidade de nossa produção.
Mais recentemente, tivemos algumas jóias, como “Central do Brasil”, “Cidade de Deus”, “Tropa de Elite”... Além de algumas indicações que não se concretizaram em vitória, “Central do Brasil” recebeu muitos outros prêmios, merecidíssimos, é certo.
Por coincidência, fui, há poucos dias, a uma das palestras do projeto “Histórias do Cinema”, no Centro Cultural do Banco do Brasil, projeto esse dirigido pela Cirlei de Hollanda, com Marcelo Aouila como Assistente de Produção, dois queridíssimos amigos. Ruy Castro falou sobre o humor em Hollywood, com aquele brilhantismo que lhe é peculiar, e deixou-me ainda mais encantada com essa arte do celulóide.
Aprendi, dentre inúmeras coisas, que Chaplin e outros tantos comediantes americanos foram discípulos de Max Linder, ator e diretor francês do início do século. Mais um ponto para o cinema francês. E foram umas duas horas com histórias fantásticas sobre a comédia nas telas. Nós, aqui da platéia, não temos a menor idéia do que se passa por trás das câmeras. Não é à toa que esse mundo da fantasia consegue nos iludir o tempo todo. Mesmo aqueles filmes do Chaplin, Burster Keaton, Harold Lloyd, com uma correria louca de cá para lá, de uma insanidade completa, tinham o roteiro todo escrito e eram muito bem preparados.
Uma das coisas que mais me chocou foi saber que Jerry Lewis e Dean Martin se odiavam, isso em razão da inveja doentia que Jerry tinha do outro. Ruy chegou a dizer que ele era uma das personalidades menos queridas de Hollywood, para não dizer uma das mais odiadas. Dizem que a inveja mata, mas não tenho tanta certeza. Ele está vivo e ainda produzindo.
Outra coisa que descobri - a dupla Gordo e Magro filmou por muito mais tempo do que Chaplin, pois o cinema falado não atrapalhou seu sucesso, vamos dizer assim. Foram mais de cem filmes! O público adorou a voz do Gordo e continuou fiel. Ruy contou que o cérebro era o Magro, que escrevia, dirigia, bolava tudo, enquanto Oliver Hardy chegava praticamente na hora de filmar e dava seu show. Seu segredo - foi o primeiro ator a “dialogar” com a câmera.
Ruy terminou a palestra dizendo que não gosta mais de ir ao cinema... Acha que não vale mais a pena. Apenas sai de casa para assistir aquele que ele considera gênio. Woody Allen. Eu até posso concordar com o talento dele, mas não vou me esquecer dos excelentes filmes políticos do Costa-Gravas, grego de nascimento, mas que atuou muito tempo na França; Truffaut, com seus Jules et Jim, O Último Metrô; e Godard, com seu mais que polêmico Jê vous salue Marie.
Adoro deitar-me de madrugada e ligar a TV para ver uns filmezinhos. Acabo dormindo no meio e acordo quando o seguinte está começando, mas nada mortal. Como repetem muito, um dia acabo vendo como acabou aquela história de amor ou desamor, ou descobrindo quem foi o assassino. Nada se compara, entretanto, ao escurinho do cinema, onde agora tem até lugar marcado, com um saco de pipoca deliciosa, uma coca-cola geladinha... E, como diz a Rita Lee, o melhor de tudo é chupar um drops de anis, longe de qualquer problema, perto de um final feliz, tomando cuidado, caso as luzes se acendam fora da hora.....FLAGRA, QUE FLAGRA!!!

3 comentários:

  1. Hi, I read your chronic about the cinema. I liked it.
    About the films with happy ends in Hollywood, Clint Eastwood likes unhappy ends and generally we expect it. I would advise him to make one with a happy end ,so it is not to be a norm the unhappy ends. Also about films, I am always amazed how the same film title is translated differently in different countries.
    Well done Ana! Go on writing them.
    Maria Melville

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  2. Gostei imenso desta sua crónica. Como sempre!
    E eu, que vivi em Paris, faz uns 35 anos, posso testemunhar, já desde essa altura, a "afficción" que os franceses têm pelo cinema. E naquela altura ainda não havia vídeo, DVD, ou home cinema.
    Sabia que um dos mais antigos e premiados realizadores de cinema europeu é um português? O Manoel de Oliveira. Tem apenas 102 anos e continua trabalhando e sendo premiado em Cannes e Berlin. Procura no Google sobre este homem multifacetado em actividades.
    Beijo cinéfilo.
    Raul

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  3. ANA.
    Seu livro vai sair bem antes do nosso,
    muito mais sensitivo.
    Já esta pronto?
    Bjs.Alvim

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