quinta-feira, 14 de outubro de 2010

UM LUGAR CHAMADO TEXAS
Maio de 2008
A palavra TEXAS tem origem indígena, como têm as designações de tantos outros lugares aqui da América. Veio do termo tejas, que é como se pronuncia, em Espanhol, o vocábulo tayshas da língua dos Hasinai, que significa amigo, aliado. É uma terra bem antiga, e especialistas, com auxílio do carbono 14, comprovaram que povos bastante desenvolvidos viveram por aqui, com evidências de tribos estabelecidas há mais de 11.000 anos!

É impressionante como o Espanhol é falado aqui nos Estados Unidos. Isso se deve não só à imigração de latinos no último século, que fazem de tudo para ficar por aqui, na esperança de uma vida melhor; no caso específico do Texas, como essas terras fizeram parte do México, que as perdeu em definitivo em 1848, no final da Guerra Mexicano-Americana, a língua original permaneceu com bastante força. Por não aceitar a anexação, aos Estados Unidos, da República Independente do Texas, que havia declarado sua independência em 1836, o México resolveu brigar para ter as terras de volta. Com a derrota, acabou sofrendo um prejuízo ainda maior, e lá se foi a área que hoje é formada pelos estados da California, Nevada, Utahm Novo México,
Texas, e parte do Arizona e do Colorado, ou seja, quase um terço do atual território americano. O Espanhol, então, marca sua presença, como se a querer lembrar a todos a origem das terras. O apelido do Texas é Lone Star State, por causa da estrela solitária da bandeira, que ostenta o vermelho, o azul e o branco; ela é praticamente igual à do Chile e só agora deixei de confundir as duas.
Segundo maior estado dos Estados Unidos, é também o segundo mais populoso, com aproximadamente 23 milhões de habitantes pelo censo de 2006. Só perde para a Califórnia, considerada um paraíso por muitos americanos e outros tantos forasteiros, que para lá se mudam. Talvez inspirados em Lulu Santos, que um dia avisou que ia para a Califórnia, viver a vida sobre as ondas, ser artista de cinema, pois o destino dele era ser star.
O território texano caracteriza-se por interessantes contrastes. As regiões ao norte e a leste apresentam rios, lagos e florestas, enquanto o sul e o oeste têm um clima mais árido, desértico em vários pontos. Há regiões em que você dirige horas e horas seguidas com a impressão de que não vai chegar a lugar nenhum, que se perdeu para sempre. Sentia-me, nessas viagens, como nos filmes - as estradas vazias, terra avermelhada ao redor, muitos cactus e, de repente, aparece um carro, e o motorista é um serial killer! Para compensar esses vazios, em outros pontos do estado, as cidades são tão próximas umas das outras que parecem ser uma só. De Houston, por exemplo, já não se sabe bem onde começa ou acaba.
Nos locais menos populosos é que surgiram os cowboys que são, hoje, um dos símbolos do estado. O interessante é que não estão apenas nas áreas rurais, e em todo canto há homens usando aquele típico chapéu e com botas bem características. Nas primeiras vezes que os vi, pensei que só estariam faltando os revólveres e as espingardas. Ledo engano, pois é o estado onde mais se vendem armas! Qualquer cidadão residente pode ter uma arma não registrada, desde que seja menor do que uma metralhadora ou do que um lançador de granadas. Pode até andar no carro com ela carregada, se o destino for um outro condado fora de sua origem, passando por um terceiro?! Mesmo sendo advogada, não consegui entender a razão desse terceiro condado. O problema é que nem mesmo o Departamento de Polícia tem idéia do armamento espalhado pelo Texas. Mesmo assim, a taxa de criminalidade é bem inferior a outros estados americanos.
A partir do início do século XX, o Texas, um estado agropecuário, viu sua economia diversificar-se e, atualmente, são as indústrias petrolífera e aeroespacial e o setor financeiro que possuem maior importância no seu desenvolvimento. São quilômetros e mais quilômetros de instalações petrolíferas, um movimento intenso de caminhões... realmente uma potência. Ë, sem dúvida, o estado que apresenta as melhores condições para superar os problemas trazidos pela recente crise. Sempre que penso em filmes passados no Texas, imagino naquelas cobras todas tentando pegar o personagem principal, o que sempre me pareceu um exagero, com cobras demais. Na verdade, é isso mesmo. São 72 tipos diferentes, sendo que 15 representam real perigo aos humanos. E as aranhas? Novecentos tipos diferentes! Felizmente, só duas são perigosíssimas, e uma é a nossa conhecida viúva negra. As outras 898 apenas assustam. E existem, nos parques, as Fire-Ants... só pelo nome já se adivinha que a picada dessas formigas queima como fogo.
Não são as cobras ou as aranhas aquilo que mais assusta mesmo todo mundo. São os furacões. O mais fraquinho tem ventos de 120 kilômetros por hora, e o mais forte passa de 250. Ainda não consegui entender direito a diferença entre furacão, ciclone, tornado e tufão, mas sei que todos são terríveis. E esses fenômenos aqui acontecem com freqüência. Se o furacão for dos mais fortes, o alerta é para que todos saiam de perto do litoral e procurem cidades mais para o interior. São milhões de pessoas de carro pelas estradas, e percursos que durariam 1 hora são percorridos em quase 20 horas. Por sorte, só peguei tempestades tropicais, também assustadores, mas os transtornos que causam são bem menores. Nos últimos anos, os piores furacões foram o Katrina e o Rita. Em 2005, o Katrina desalojou cerca de um milhão de pessoas, e o Rita, logo depois, fez estragos nas Bahamas, em Cuba, México e Estados Unidos. Importante lembrar que os nomes de furacões não são apenas femininos, como muitos engraçadinhos gostavam de contar - também são masculinos! Existe uma relação de nomes já definidos por um organismo internacional, que se repetem a cada seis anos. Os mais violentos têm sua denominação retirada da lista, talvez por superstição. Mas esses dois mais recentes, realmente terríveis, tinham nome de mulher...
E como sempre tudo tem dois lados, acabei descobrindo que os furacões desempenham importantes funções ecológicas – servem para renovar os mangues, reequilibrar a atmosfera e restaurar a salinidade dos estuários. Isso dá algum conforto aos que sofrem com as consequências? Por certo que não, mas não podemos negar que são necessários.
Novo assunto. Na Primeira Guerra Mundial, a frota de navios americanos foi escoltada para a Europa por um navio de guerra que homenageou o estado - USS Texas. Na Segunda Guerra, participou do desembarque na Normandia e foi “aposentado” em 1946, sendo, hoje, um museu flutuante. Em sua longa trajetória como um dos mais importantes vasos de guerra americanos, sofreu somente uma baixa, o que é um recorde bastante interessante. Na visita a esse ponto histórico, descobri que a Coca-Cola é mais antiga do que eu. No refeitório dos marinheiros, há uma máquina do refrigerante mais conhecido do mundo com sua inconfundível marca registrada. Foi produzida, primeiramente, como nova versão de uma bebida francesa, em 1884, ainda contendo álcool. Em razão de leis que proibiam a produção e ingestão de bebidas alcóolicas, seu inventor, em 1886, desenvolveu uma nova fórmula que não contrariava a lei. De início, foi vendida como medicamento, tornando-se logo bastante popular, pois diziam que curava dor de cabeça, neurastenia, dispepsia e, acreditem, impotência. Imaginem só. Era vendida em máquinas e somente em 1935 passou a ser comercializada em garrafas. Cheguei a fotografar uma dessas primeiras máquinas, bem semelhante a uma bomba de gasolina. Em latas, só em 1955.
Voltando ao Texas, descobri que tem várias cidades com nomes interessantes e que algumas apresentam coisas diferentes, insólitas mesmo. Paris, por exemplo, a melhor pequena cidade do estado, tem até uma réplica da Torre Eiffel. Só que com um chapéu de cowboy no alto. E que é vermelho! Gustave Eiffel, lá do céu, deve ter ficado louco quando viu isso. Seu maravilhoso projeto foi alterado e ganhou um adereço que não combina com a obra. Mais uma coisa diferente? Vá até Hunt, onde poderá visitar a réplica de Stonehenge, cuja altura equivale a pouco mais da metade do monumento original na Inglaterra, e que tem quase a mesma circunferência. Para completar, estão lá também réplicas das estátuas encontradas na Ilha de Páscoa. Pisa tem sua torre inclinada? A cidade texana de Groom tem uma também... só que é uma torre com um reservatório de água. Pensa-se logo que perdeu o prumo por causa de um furacão, mas não foi nada disso. Para atrair mais fregueses para seu restaurante, o dono do estabelecimento contratou engenheiros que atenderam ao seu sonho maluco e projetaram com a inclinação. O restaurante pegou fogo há algum tempo atrás e não existe mais. A torre, no entanto, continua inclinada e chamando atenção. Talvez sobreviva à maravilhosa torre italiana.
Confesso não saber qual dessas idéias é a mais estranha, mas um dos mais fortes candidatos é o Cadillac Ranch, em Amarillo, junto à histórica Rota 66. Um milionário excêntrico juntou dez cadillacs usados, daqueles “rabo de peixe”, e enterrou-os em seu campo de trigo até a metade, deixando de fora só a traseira. Os visitantes são convidados a ilustrar as carrocerias, cada um escrevendo o que quiser, desde declarações de amor eterno, passando por estranhas mensagens ao mundo e chegando a manifestações delirantes. Os menos ousados preferem escrever apenas o nome ou as iniciais. Entretanto, quando a excentricidade faz com que um milionário chinês reconstrua a Cidade Proibida de Beijing, talvez possamos aplaudir de pé. Temos, em Houston, uma espécie de parque temático histórico, que é realmente um assombro. Em réplicas com 1/3 do tamanho original, podemos ver o exército de 6.000 soldados em terra-cota do Imperador Qin. E a cidade em si apresenta-se com um vigésimo do tamanho original. Não sei se procede a informação, mas soube que os próprios chineses que moram no Ocidente preferem vir ver essa aqui a enfrentar toda a burocracia para ir até a China.
E como se não bastasse, surpreendi-me, há alguns dias, com uma das paisagens mais belas que já vi. Eram oito e meia, e a noite acabara de chegar. O Centennial Park, todo gramado, parecia um lago verde, margeado por árvores majestosas, belíssimas... não se vislumbrava uma única construção. No céu do mais puro azul escuro, uma enorme lua cheia, dourada, mas tão dourada, que custei a acreditar no que estava vendo. Emocionada, torci pelos que, naquele momento, sonhavam com seus amores. Implorei aos poetas que pensassem suas rimas e, com a magia daquela lua, encantassem as palavras e fizessem nascer os mais belos poemas... Era a Natureza, vitoriosa, exuberante. As estrelas, escondidas, não quiseram aparecer, humilhadas com tamanha beleza. O Texas me oferecia um céu para que eu nunca mais pudesse esquecer essa terra que, honrando seu nome, fez com que eu me sentisse em casa, entre grandes amigos.