terça-feira, 19 de março de 2013


O TEMPO PASSA, O TEMPO VOA...
Março de 2013

Penso muito no Tempo.  Talvez essa energia em megahertz que me acompanha há décadas traga, de maneira discreta, a preocupação – vou ter tempo ?  Tantas coisas interessantes que ainda quero fazer...Tem gente que diz que tempo é dinheiro, mas eu discordo.  Tempo é vida.

O Quarteto é uma comédia dramática, sobre esse terceiro tempo da vida, e um de seus personagens principais, assediando sexualmente as mulheres que passam por perto, faz o contraponto para nos alegrar quando o que acabamos de ver abala as estruturas.  E vamos na montanha russa entre o riso e a reflexão. Aqueles simpáticos velhinhos, todos artistas, vivem em um belo recanto, na Inglaterra, e nos divertimos e nos emocionamos com os preparativos para o concerto anual dos residentes, com o grupo tentando angariar fundos para que o lar onde esses idosos vivem não seja desativado.   Vale a pena conferir na telona esse primeiro trabalho do Dustin Hoffman como diretor, deixando pra lá algumas ácidas críticas, a meu ver, injustas.

Como cheguei recentemente dos Estados Unidos, onde existem muitos condomínios para idosos, fiquei curiosa em saber o que o Brasil oferece para nós.  Encontrei dos mais variados padrões, alguns até bem simpáticos, mas com precinhos meio antipáticos, e de um formato um pouco diferente.    De qualquer modo, não precisam mais ser, apenas, depósitos de velhos, e não são mais, em sua maioria.

A psicanalista Angela Mucida discorda dessas comunidades para quem ainda está em boas condições, pois considera uma desvantagem o distanciamento de pessoas de outras faixas etárias, o que, muitas vezes, é inevitável. Já temos um quinto dos idosos vivendo sozinhos no Brasil, e os sessentões, e mesmo os mais adiantados nos anos não são mais aqueles velhinhos dependentes, sentados nas cadeiras de balanço, olhando o mundo de longe – vão à academia, saem para dançar, formam grupos e se divertem, deixando em paz os filhos e netos, que estão completamente atordoados com a vida profissional, filhos pequenos, e toda essa correria dos tempos modernos. 

O que está mais do que provado é que uma boa vida social, exercícios físicos e alimentação acertada trazem excelentes resultados.  Clube do Bolinha, da Luluzinha, Clube da Letra, onde a turma escreve coisas lindas, enfim, clubes ou associações com interesses comuns são fáceis de se organizar e são um remédio sem qualquer contraindicação para uma vida bem mais saudável.  Ando pensando em fundar, qualquer dia desses, um com pessoas que queiram pintar e bordar.  Espero ter muita gente interessada...

Outro dia, enquanto olhava coisas bonitas em uma loja de decoração, ouvi uma mulher dizer que já tinha dobrado o tal cabo da “boa esperança”.  Não me contive e dei meus palpites errados.   Foram muitas risadas, felizmente.  Eu espero que a tal mulher, de apenas 57 anos, fique mais animadinha e descubra quanta coisa boa a vida ainda nos reserva.  Cabo da Boa Esperança é para Bartolomeu Dias, não para mim.

Não vai dar tempo, eu sei, para fazer tudo que se passa nessa cabeça arteira, mas não seriam nem mesmo mil anos que iriam resolver esse problema.  E, além disso, a vida, depois da tal esquina dos cinquenta, vez por outra oferece novidades e surpresas boas, e os planos que fizemos nem sempre são seguidos à risca mesmo com todo o tempo do mundo.  O que vale é ir saboreando o que se tem de melhor enquanto o tempo passa, enquanto o tempo voa... Enquanto isso, um excelente poema de Viviane Mosé – Tempo.

“Quem tem olhos pra ver o tempo soprando sulcos na pele / soprando sulcos na pele  / soprando sulcos? / o tempo andou riscando meu rosto  / com uma navalha fina / sem raiva nem rancor / o tempo riscou meu rosto com calma / com calma / (eu parei de lutar contra o tempo /  ando exercendo instantes / acho que ganhei presença) / acho que a vida anda passando a mão em mim / a vida anda passando a mão em mim / acho que a vida anda passando /a vida anda passando / acho que a vida anda./ a vida anda em mim / acho que há vida em mim. / a vida em mim anda passando. / acho que a vida anda passando a mão em mim / e por falar em sexo quem anda me comendo é o tempo / na verdade faz tempo mas eu escondia / porque ele me pegava à força e por trás / um dia resolvi encará-lo de frente e disse: tempo / se você tem que me comer / que seja com o meu consentimento / e me olhando nos olhos / acho que ganhei o tempo / de lá pra cá ele tem sido bom comigo / dizem que ando até remoçando”