domingo, 25 de abril de 2010

ÀS VOLTAS COM A LEI
Abril de 2010.

Volto ao Texas, após 10 meses, para matar as saudades do filho, da nora, e dos netos, esperando curti-los antes que virem adultos e fujam mundo afora. As viagens sempre me assustam, pois tenho pavor de avião, mas, por sorte, foram poucos minutos de turbulência e três bons filmes para assistir. Ganhei, para compensar, 9 horas de espera em Atlanta até conseguir um vôo para Houston. Como estava muito bem acompanhada do Monsenhor Quixote, delicioso livro de Graham Greene, nem me importei muito. O corpo resmungou, mas nada demais.
A vida não dá nada de graça, e matar as saudades de uns nos obriga a ter saudades de outros. A gente aprende a viver com a falta, mas é uma pena que não se possa ter tudo. Foi bom estar de volta ao lugar onde já havia morado por 11 meses, a uma comunidade que nos aceitou de braços abertos, sem qualquer preconceito contra “los cucarachos” que vieram para esse país trazer a arte do jiu-jitsu brasileiro. Sinto-me em casa, sempre.
Havia decidido fechar a conta no Wells Fargo. Estava com muita pena, pois a experiência bancária que tive foi a melhor possível. Sabia que entraria, depois desse tempo todo, e que Jason, o gerente, iria me receber com um “- Hello, Ana, I am glad to see you are back to League City”. Como ele não estava, fui atendida pelo subgerente, Kyle Hallmark, com quem eu estivera apenas uma vez. Quando disse a ele que queria fechar a conta, pois não mais ficaria nos Estados Unidos por períodos longos, ele se lembrou que havia feito qualquer coisa para mim ano passado. Lembrou-se que era brasileira e fez a maior festa. Aconselhou-me a não fechar a conta, já que eu tinha isenção completa de taxas. Bastaria deixar um dólar e a conta permaneceria aberta, sem prazo. Assim, todas as vezes que eu vier, poderei depositar o dinheiro trazido e movimentar conforme a necessidade. Aceitei a sugestão e tirei o dinheiro da poupança, meros trezentos dólares, para juntar aos quinhentos que havia na conta corrente e, assim, continuar com a tal isenção. Devo esclarecer que fiz tudo isso sem sair da cadeira. Ele se levantava, ia ao caixa, voltava, eu assinava, ia de novo... E sem pagar taxas!!! Pois é, o gerente se vira em três por causa de uma droga de conta que só tem oitocentos dólares... e que na qual vão sobrar apenas uns dois ou três no dia 19 de maio, quando volto para o Brasil! Kyle merece um CD com gostosas músicas brasileiras... vou levar para ele hoje.
Outra excelente experiência vivida nessas bandas... um “acidente” de carro. Confesso que, mesmo antes de vir, preocupava-me o fato de estar há muito sem dirigir um carro automático. No Brasil, meu carro não tem nem direção hidráulica... e tenho que passar as cinco marchas o tempo todo no trânsito engarrafado do meu Rio de Janeiro. Enfim, guerra é guerra e lá fui eu matar a saudade de meu “possante”, um Toyota Avalon 1998, passeando por todo o lado dessa cidade que é considerada umas das cem melhores pequenas cidades americanas.. Depois do Banco, lá fui eu estrada afora, profundamente encantada com a organização do trânsito, todo mundo respeitando tudo, ninguém buzinando porque você demorou mais a movimentar o carro quando o sinal abriu.
De repente, não mais que de repente, ainda com o reflexo condicionado ao meu Peugeot carioca, procurei a embreagem para trocar a marcha no Toyota, que é automático, repito... não achei a embreagem... achei o freio e... freiei! A caminhonete do tipo 4 x 4 que vinha atrás, que mais parecia um microônibus, simplesmente entrou na traseira do meu bonitinho. Foi uma senhora pancada, e sinto o pescoço até hoje, três dias depois.
Saltei do carro, envergonhadíssima... Uma burrice ímpar! Pedi desculpas, e o dono do outro carro, um sessentão bem gorduchinho, super educado, disse que ia chamar os “cops”, já que o carro dele tinha sofrido danos... O meu, mesmo velhinho, estava intacto... segurou o forte tranco com a maior coragem! Tiramos os carros do meio da rua e ficamos aguardando. Deve ter ligado para o famoso 911.
Confesso que, na maior discrição, liguei logo para um dos meus “sobrinhos” policiais de Houston, cujos números dos celulares ficam em destaque na minha agenda. Claro que não ia pedir que aliviasse a situação, mas queria instruções, pois é um outro país! Eu queria perguntar se poderia mexer na bolsa sem que o colega dele achasse que eu ia tirar um Colt 45 e dar um tiro nele... nunca se sabe como são as paranóias de cada lugar. Juan Carlo não estava... fazer o quê?
O policial escalado pela Central chegou em menos de 10 minutos! A “vítima” foi logo contando que eu parei de repente e causei o acidente; enquanto isso, eu permanecia muda. O policial foi logo olhar a traseira do meu carro e pediu minha carteira de motorista e o seguro. Não se anda com documento de carro aqui... Só com o papel do seguro. Entreguei junto meu passaporte e disse que estava de visita por um mês. Nesse momento, confesso que me questionei por não ter chamado meu filho... mas não queria atrapalhá-lo no trabalho, e por isso tinha resolvido enfrentar sozinha as conseqüências de minha distração; enfim, a sorte estava lançada.
O Sargento Keller foi averiguar o carro “ferido” e constatou que o 4x4 estava com o pára-choque dianteiro avariado... Nada grave, mas estava. O policial disse que era norma deixar que as partes se entendessem quando o prejuízo fosse inferior a mil dólares. O americano foi logo dizendo que o conserto do carro dele ultrapassaria tal valor, pois era um carro classe A; queria, então, preencher uma tal de blue form... imagino que seja o formulário apropriado para iniciar algum procedimento judicial. Foi, então, que o céu ficou ainda mais azul naquele esplendoroso dia.
“The cop”, super gentil, disse ao americano que a vítima era eu, já que, segundo a lei americana - sorte minha ser como no Brasil - o motorista tem o direito a parar quando bem entender, e os outros, sim, é que não podem dirigir tão perto do carro da frente. Assim, ele era o culpado! Como autoridade, poderia fornecer a blue form para ser preenchida, mas eu seria a pessoa a alegar prejuízos! O homem ficou furioso e foi embora depressa, por certo com medo que eu fosse daquelas pessoas cretinas que fingem uma dorzinha aqui, outra ali,para ganhar uns trocados... Eu, na verdade, só queria ir embora com minha culpa discretamente escondida na bolsa, onde não tinha nenhum Colt 45, para me defender do outro motorista, que provavelmente tinha uma arma. O Texas é o Estado mais “armado” aqui nos Estados Unidos.
Isso tudo durou uns 20 minutos. No máximo. Descobri que são cerca de seis milhões de acidentes de carro por ano nos Estados Unidos. Acho que essa minha historinha nem vai contribuir para a estatística, pois virou um nada. Peguei o carro e continuei meu reconhecimento do território, com a atenção redobrada. Sou, agora, a motorista mais cautelosa de todo o Texas. Sorte igual a essa, não sei se serei merecedora novamente. Dizem que os raios não caem duas vezes no mesmo lugar, para o bem ou para o mal. Mas a experiência com a polícia foi bastante interessante. Minha condição de turista latina não me fez menor perante o representante da lei. O cidadão americano estava errado, segundo as regras de trânsito. E assim foi o caso julgado. Sem pensar em comparar, instintivamente comecei a cantar, do Tom e do Vinicius, “Se todos fossem iguais a você... que maravilha viver...” As estradas que me aguardem!

4 comentários:

  1. UFA!!!!!!
    Que gringo encrenqueiro, hein? Já queria se dar bem às suas custas...
    Ainda bem que foi só um susto!!!!

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  2. Estava pensando...
    Além dos folders de atrações turísticas, na dúvida, é melhor termos os drivers booklets em mãos também!
    Para te poupar tempo, aqui vai o do Texas! http://www.txdps.state.tx.us/ftp/forms/DLhandbook.pdf
    Beijoooooooooo

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  3. Here is the same . It is the driver behind that is always guilty. I very rarely find anyone with bad experiences in the USA. And why does your friend Debora is judging that the American is trying to be to put the guilt to you. He is only following the law waiting for the police and put his case, as he has the right to. May be the comment is only for a laugh. Very good chronic. I loved it.

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  4. As croniquetas, como vc as chama, nos ajudam a passar os dias com vc em Houston. Cada dia uma novidade. Ainda bem que o final deste evento foi feliz.
    Bjs

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